Em The Office, série de humor norte-americana que foi ao ar entre 2005 e 2013, mas com enorme audiência no Amazon Prime nos últimos meses, Michael Scott, um gerente cuja filosofia se baseia no entretenimento de seus funcionários, fugindo a qualquer modelo comum de gestor de equipes, inesperadamente pede demissão da empresa em que esteve durante 15 anos. Desempregado e sem qualquer perspectiva de ser contratado na mesma área, tem a brilhante ideia de abrir sua própria empresa no mesmo ramo de atividade, mas logo descobre que a realidade não se baseia exclusivamente em otimismo e humor. Um dia, diante do clube de investimentos da vovó, é confrontado por ela sobre qual era a sua missão. Sua resposta: “Eu não serei derrotado. Eu nunca desistirei. Eu estou em uma missão”. Seu melhor argumento foi: “eu sei que o vovô iria querer isso”.
Resultado: nem mesmo a avó confiou o bastante para financiar o projeto de seu neto. Sua negativa veio acompanhada da frase: “Isso não é um clube de doações, é um clube de investimentos”.
Sim, esta é uma série de humor e não devemos levá-la ao “pé da letra”. Entretanto, esta cômica cena nos ensina que se não soubermos qual a nossa missão, dificilmente alcançaremos o que de nós é esperado e dificilmente as demais pessoas enxergarão em nós o que deveriam enxergar. Se pensarmos que “eu nunca desistirei”, prosperar, comprar uma casa e educar bons filhos é tudo o que resume nosso propósito, como cristãos falharemos em nossa caminhada.
A história de Josué
Quando lemos a história de Josué, acertamos se reconhecemos que ele é um homem em missão. No entanto, erramos se pensamos que a sua principal missão se resume a conquistar a terra de Canaã. Nos acostumamos a enxergá-lo como o grande general hebreu, e isso nos faz enfatizar as suas grandes vitórias e achar que ele completou sua missão por causa delas.
Sim, Josué completou o seu propósito, porém ele era maior e mais difícil do que vencer qualquer batalha. Sua missão era ser fiel ao Senhor, servindo como paradigma de fidelidade para o povo sob o seu comando. Duas designações para ele demonstram como iniciou a sua caminhada e como a completou: 1) servidor de Moisés; 2) servo do Senhor.
Josué, o servidor de Moisés
Após a morte do grande líder de Israel, Deus se dirigiu a Josué para detalhar sua missão. Josué retrata o episódio com as seguintes palavras: “Sucedeu, depois da morte de Moisés, servo do Senhor, que este falou a Josué, filho de Num, servidor de Moisés” (Js 1.1). Ao se referir a Moisés, Josué o chamava de “servo do Senhor”, ao falar de si mesmo dizia ser “servidor de Moisés”. Por que disto?
Josué, desde a saída do Egito, sempre foi uma espécie de “braço direito” do grande líder de Israel. Quando este subiu ao monte Horebe para receber as tábuas da lei, Josué estava com ele (Êx 24.13-15). Ele não se apartava da tenda da congregação e era assim, “servidor de Moisés”, que o próprio Moisés o chamava (Êx 33.11). Assim, ao longo do seu próprio livro, Josué usa a expressão “servo do Senhor” somente aplicado à Moisés (13 vezes), nunca a si próprio. Ele sabia que era um homem em missão.
A missão de Josué
Há dois momentos em que Josué recebe a sua missão. O primeiro, quando o Senhor anunciou à Moisés que sua morte estava próxima e que ele passaria a ordenar a Josué (cf. Dt 31.14, 23). O segundo, quando o Senhor falou exclusivamente com Josué (cf. Js 1.1-9). Ambos têm duas frases semelhantes: 1) “Sê forte e corajoso”; 2) “porque tu introduzirás os filhos de Israel na terra que, sob juramento, prometi”. Contudo, no segundo um novo elemento é acrescentado, que pode ser resumido pela seguinte ordem: “Tão somente sê forte e mui corajoso para teres o cuidado de fazer segundo toda a lei que meu servo Moisés te ordenou; dela não te desvies, nem para a direita nem para a esquerda, para que sejas bem-sucedido por onde quer que andares” (Js 1.7).
Desta forma, a missão de Josué possui dois elementos: 1) confiança no juramento do Senhor; 2) fidelidade, mediante o cumprir de toda a lei que Moisés ordenou. Em suma, Josué deveria ser fiel e confiar no Senhor, assim como Moisés foi fiel e confiou no Senhor. Sua missão era deixar de ser o servidor de Moisés e se tornar como este servo do Senhor.
Josué, o servo do Senhor
Como vimos, Josué nunca se chamou de “servo do Senhor”, esta era uma designação, em sua mente, exclusiva para Moisés. Mas, após a sua morte, o povo de Israel passou a chamá-lo assim. Quem finalizou o livro que leva o seu nome (cf. Js 24.29) e quem escreveu o livro dos Juízes (cf. Jz 2.8) registraram a percepção sobre a sua vida. Morreu o “servo do Senhor”.
O legado de Josué vai além da grandiosa vitória que deu início à conquista de Canaã contra Jericó. Nem mesmo se resume à incrível estratégia aplicada para derrotar a cidade de Ai. Seu legado à posteridade se evidencia porque ele cumpriu a sua missão. E, uma vez que a cumpriu:
“Serviu, pois, Israel ao SENHOR todos os dias de Josué e todos os dias dos anciãos que ainda sobreviveram por muito tempo depois de Josué e que sabiam todas as obras feitas pelo SENHOR a Israel” (Js 24.31)
Conclusão
Como cristãos, nossa missão deve estar clara. Ela não é prosperar, alcançar grandes vitórias, nem mesmo criar filhos educados e de bem. Nossa grande missão é sermos servos de Jesus, porque ele também foi o Servo do Senhor (cf. Fp 2.5-8; Is 53).
O grande legado que podemos deixar dependerá se nossos filhos, familiares, amigos e colegas de trabalho testemunharem da nossa confiança em Deus e fidelidade a ele. A recompensa para o cumprimento da nossa missão é um dia ouvir do próprio Cristo: “Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor” (Mt 25.21, 23).
Geimar Lima
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