Baseado em Êxodo 7.14-24
A primeira audiência de Moisés com Faraó, para tratar da libertação do povo hebreu da terra do Egito, foi um tiro no pé, humanamente falando. Na visão de Faraó, toda essa história de querer ir ao deserto para prestar culto ao Senhor era fruto de ociosidade. “Vamos dar mais serviço para esse povo, aumentar o rigor do seu trabalho e veremos se continuam com essas ideias”, pensou Faraó. Na visão de Moisés, o resultado da primeira audiência ficou aquém daquilo que ele planejava e trouxe problemas, além do que ele imaginava. Assim sendo, a expectativa de que essa primeira praga fosse ser bem-sucedida era pequena, na mente de Moisés e do povo hebreu. “Tem que dar certo! Do contrário, Faraó irá nos matar desta vez”, pensava o povo.
O anúncio de como deveria acontecer a primeira praga é descrito em Êxodo 7.14-24. Nessa passagem, Deus passa a Moisés as orientações de como deverá agir, onde ele deverá estar e quando realizar o sinal preparado por Deus. Essas instruções parecem levar em consideração uma rotina já conhecida de Faraó, pois Deus pede a Moisés para ir encontrá-lo às margens do Nilo em sua caminhada matinal. É óbvio que Deus conhece todos os passos de Faraó, mas por que ele escolheu esse momento para realizar o primeiro sinal na terra do Egito? O que exatamente estava em jogo nesse plano de encontrar Faraó às margens do Nilo?
Quando somos convocados para colaborar com planos que outras pessoas fazem, é comum querer saber os objetivos pretendidos. Pensemos um pouco nos objetivos de Deus com a primeira praga.
O que não fazia parte do objetivo de Deus?
É muito comum encontrar pessoas que acreditam que as pragas do Egito tinham o propósito de amolecer o coração de Faraó. Deus ia pressionar e o coração de Faraó ia amolecer. Essa é uma ideia absurda, pois Deus não precisava de um coração amolecido para conseguir tirar o seu povo do Egito. Desde o início, ele já havia deixado claro a Moisés que o endurecimento do coração de Faraó era parte do plano (cf. Êx 7.3). Não é fácil entender e explicar como essa estratégia contribuiria para o objetivo final, mas Deus garantiu a Moisés que o endurecimento do coração de Faraó seria indispensável para o que ele queria fazer. Quando lemos, então, que Faraó não obedeceu ao mandado do Senhor, a conclusão não deve ser de que a estratégia de Deus não funcionou. Pelo contrário, a estratégia funcionou muito bem.
Há também aqueles que acreditam que as pragas tinham a finalidade de castigar e amaldiçoar a terra do Egito. A única vez que a palavra castigar aparece relacionada com as pragas é no caso das rãs: “Se recusares deixá-lo ir, eis que castigarei com rãs todos os teus territórios” (Êx 8.2).
Talvez a melhor alternativa seja entender as pragas como um “julgamento”, seguindo aquilo que Deus havia dito a Abraão séculos antes: “Mas também eu julgarei a gente a que têm de sujeitar-se; e depois sairão com grandes riquezas” (Gn 15.14). De qualquer forma, é bom deixar claro que o objetivo principal das pragas não era amaldiçoar ou castigar o Egito.
A convicção mais comum é a de que as pragas do Egito tinham como objetivo principal a confrontação com os deuses do Egito. Todavia, essa confrontação só foi mencionada na última praga e, por isso, deve ser entendida como parte do objetivo maior que é julgar. Veja o que diz este texto: “Porque, naquela noite, passarei pela terra do Egito e ferirei na terra do Egito todos os primogênitos, desde os homens até aos animais; executarei juízo sobre todos os deuses do Egito. Eu sou o Senhor” (Êx 12.12).
Qual era o principal objetivo de Deus com as pragas?
O grande objetivo das pragas foi o de fazer saber que só o Senhor é Deus. Você se lembra do que aconteceu na primeira vez que Moisés pediu a Faraó para libertar o povo? Ele recusou-se imediatamente a atender o pedido, ignorando quem o Senhor era: “Quem é o Senhor para que lhe ouça eu a voz e deixe ir a Israel? Não conheço o Senhor e tampouco deixarei ir a Israel” (Ex 5.2). Ora, essa ignorância a respeito do Deus de Israel estava com os dias contados. Logo teriam a oportunidade de conhecer muito bem quem era o Deus dos hebreus, e o conheceriam de uma forma que nunca mais se esqueceriam.
De fato, isso parece ser um objetivo razoável. Demonstrar a identidade do Deus dos hebreus era mais importante do que confrontar os deuses do Egito. Em várias ocasiões, durante o período das dez pragas, Deus justificava o que estava fazendo nos seguintes termos: “nisto saberás que eu sou o Senhor” (Êx 7.17). Se esse é o caso, a pergunta que deve ser feita é: Como esta primeira praga cumpre o objetivo de demonstrar que o Senhor é quem ele diz ser – Yahweh?
Quando Deus disse a Moisés para ir ao encontro de Faraó às margens do Nilo, ele sabia de um detalhe que alguns leitores atuais talvez não saibam. O motivo da caminhada matinal de Faraó às margens do Nilo era religioso. Há registros que descrevem o ritual diário de Faraó e suas orações feitas no templo de Amon-Re. Nesse ritual, havia um momento designado para “quebra do selo de barro”, um gesto simbolizando um rompimento das artérias de Osíris, cujo sangue derramado dava origem às águas do Nilo. Após a quebra do selo de barro, o Faraó se dirigia às margens do rio e terminava suas orações contemplando o exuberante leito do Nilo, sinônimo da vitalidade dos deuses do Egito.
Dessa forma, podemos dizer que Moisés não apenas interrompeu o período de devoção matinal de Faraó, mas também matou simbolicamente a divindade que Faraó adorava naquela manhã. O fato de transformar água em sangue ter que acontecer na presença de Faraó (cf. Êx 7.15 “põe-te em frente dele”) é uma evidência de que não poderia haver qualquer dúvida quanto à autoria do milagre. Faraó precisava saber, sem qualquer sombra de dúvida, que o mesmo Senhor que ele disse não conhecer estava envolvido naquele prodígio. Esse, então, é o primeiro e maior objetivo desse sinal.
A reação esperada dos egípcios seria de nojo e aversão ao Nilo e a todos os reservatórios de água espalhados pelo Egito, iniciando assim uma interferência direta no relacionamento dos egípcios com sua divindade. A primeira praga compromete a comunhão entre os egípcios e a divindade que adoravam. A devoção foi substituída pelo nojo.
Há ainda um detalhe adicional que comprova ser esse o principal objetivo da primeira praga: o instrumento utilizado para realizar o milagre. Conforme instruído pelo Senhor, Moisés deveria usar a mesma vara que havia se transformado numa serpente. Não importa se foi Moisés ou Arão quem utilizou a vara para executar os sinais, o fato de ter se tornado em serpente revela que havia algo inerente à vara que não dependia de quem a usasse. Em outras palavras, o fato de Faraó já ter visto anteriormente que a vara tinha caraterísticas peculiares retirava a ênfase daquele que a manuseava, pois ele sabia que era o Deus em nome de quem Moisés falava que estava realizando aquele prodígio.
Portanto, a imagem que o primeiro sinal comunicava ia muito além de uma mera disputa entre a serpente de Arão e a serpente dos mágicos do Egito, pois descreve, de maneira dramática, o destino final da soberania até então inquestionável do Egito. Este primeiro sinal anuncia a sentença final contra Faraó e seu povo.
Conclusão
O objetivo que estabelecemos para nossos projetos determina, em grande parte, a nossa motivação. Quando não abraçamos por completo o objetivo de uma missão, nos deixamos tomar pelo desânimo, dúvidas e discordância costumam ser frequentes. O objetivo maior da libertação do povo hebreu precisava ser claro: libertação implica derramamento de sangue. Da mesma maneira que o primeiro e o último sinais de libertação tinham que ver com sangue, a nossa libertação da escravidão do pecado inicia e termina com o sangue de Cristo, o unigênito filho de Deus. Encorajemos uns aos outros no reino de Deus com esse objetivo.
One Comment
Júlio L. Fondo
01/26/2018 at 09:17Ó brigado pela sa bedoria.