A estultícia está ligada ao coração da criança, mas a vara da disciplina a afastará dela.
(Pv 22.15)
Há várias enfermidades que assolam o ser humano, mas aquelas que são conhecidas por querer se alojar no coração (ou ao redor dele) são as mais perigosas. Esse provérbio ilustra esse perigo dizendo que a estultícia está ligada ao coração da criança. Estultícia é a característica do que é ou se apresenta de modo estúpido. A “criança” em vista aqui deveria ter uns 19 anos. Isso mesmo. O termo hebraico que foi traduzido aqui como “criança” é o mesmo que foi usado para descrever o jovem que se envolveu com a mulher adúltera no capítulo 7 do livro de Provérbios. A preferência pela tradução “criança” é geralmente resultado de uma preconcepção em nossa cultura de que não adianta mais bater num filho de 19 anos. A justificativa: se ele não aprendeu até agora, não será a vara que irá fazer isso.
Bem, há vários problemas com essa abordagem. Primeiro, a cultura israelita do período do Antigo Testamento não via a disciplina como a vemos hoje. Disciplinar um filho de 19 anos com vara tinha um valor pedagógico para toda a comunidade na qual aquele jovem estava inserido. Disciplinar com vara no contexto daquela cultura não tem nada a ver com o costume em nossa cultura de “levar o menino para o banheiro e dar-lhe umas palmadas”. A disciplina que o livro de Provérbios tem em mente era pública. Isso prevenia que os pais cometessem excessos no ato de disciplinar. A disciplina era aplicada pelos pais ou pelos anciãos da comunidade. Isso evitava que os motivos para a aplicar dependessem somente da opinião dos pais.
Esse provérbio não está nos obrigando a disciplinar nossos filhos nos moldes da cultura israelita primitiva. Para disciplinar um filho hoje, nos moldes da cultura israelita primitiva, precisaríamos não somente da vara, mas daquela comunidade, daqueles anciãos e daquela cultura. A verdade apresentada é: a atitude de tolice sempre busca se alojar nos corações de nossos filhos e filhas. O tempo não irá faze-la desaparecer ou afastar-se de seus corações. A vara da disciplina hoje poderia ser um tratamento público (isto é, no contexto de uma comunidade local) da delinquência dos filhos. Isso mostraria não só para nossos filhos, mas também para aqueles que vivem sua delinquência em anonimato, que a comunidade que busca andar nos caminhos do Senhor promove virtudes e não tolices. A propósito, acho necessário dizer que o tipo de tolice e estupidez que este provérbio tem em vista inclui: homicídios por diversão, prostituição, preguiça crônica, mentira e talvez difamação. São estas coisas que o livro de Provérbios considera como estultícia que se aloja no coração.
Daniel Santos