É isso mesmo. Difícil de acreditar, mas aconteceu e ficou registrado para servir de lição para as gerações seguintes. Eis algumas lições que eu tenho aprendido com esse episódio:
I. Preciso entender corretamente a irredutibilidade de Deus.
Ser irredutível significa não se deixar submeter ou não se deixar convencer por opiniões contrárias. No caso específico dessa passagem bíblica, Moisés insistia com Deus a respeito de algo que queria muito – entrar na terra prometida e conhecê-la de perto. A resposta de Deus revela que Moisés já vinha insistindo no assunto havia um bom tempo. Mesmo assim, a resposta foi negativa: “Basta! Não me fales mais nisto”. Pode parecer um castigo muito duro para alguém que tinha tanto prestígio e gozava de uma intimidade tão grande com Deus, mas aí está o centro da primeira grande lição: não importa quanto prestígio ou intimidade eu tenha com Deus, isso nunca me isentará da responsabilidade de honrá-lo diante dos olhos das pessoas. Esse foi o motivo pelo qual Moisés não teve sua oração respondida (conferir Dt 32.51). A irredutibilidade de Deus tinha uma finalidade pedagógica para Moisés e os que viveram em seus dias. Hoje, ela me ensina sobre uma hierarquia de valores da qual não posso me esquecer: a honra a Deus é mais importante que a resposta ao meu pedido.
II. Preciso entender corretamente o esquecimento de Deus
Eu já me peguei pensando algo nos seguintes termos: Será que Deus se esqueceu de mim? Será que ele não ouve mais as minhas orações? Será que não sou mais contado entre aqueles que são alvos da sua bondade? O meu dilema aumenta quando vejo personagens bíblicos pensando e falando as mesmas coisas. É o caso do Salmo 17.1 “Ouve, Senhor, a causa justa, atende ao meu clamor, dá ouvidos à minha oração, que procede de lábios não fraudulentos”. Eu me consolo ao ver que nessa lista podemos incluir o clamor de Jesus: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Por que se acham longe de minha salvação as palavras de meu bramido? Deus meu, clamo de dia, e não me respondes; também de noite, porém não tenho sossego” (Sl 22.1-2). Há várias razões pelas quais Deus parece ter se esquecido do seu povo. Veja algumas.
- Quando ele se esqueceu do seu povo no Egito: “Decorridos muitos dias, morreu o rei do Egito; os filhos de Israel gemiam sob a servidão e por causa dela clamaram, e o seu clamor subiu a Deus. Ouvindo Deus o seu gemido, lembrou-se da sua aliança com Abraão, com Isaque e com Jacó” (Ex 2.23–24). Esse aparente esquecimento deve ser entendido como parte do projeto escatológico de Deus anunciado a Abraão em Gênesis 15. O que eu aprendo com isso? O que Deus faz comigo e por mim está sempre associado e dependendo daquilo que ele vem fazendo há gerações na vida de tantas outras pessoas.
- Quando ele se esqueceu do salmista: “Até quando, Senhor, esquecer-te-ás de mim para sempre? Até quando ocultarás de mim o rosto?” (Sl 13.1). O que o salmista descreve como esquecimento é a demora de Deus para vingar os inimigos que se levantaram contra os filhos de Deus. O desespero do salmista ficou registrado na Bíblia para nos ensinar que aquilo que tanto nos apavora não apavora a Deus na mesma proporção. O que o salmista viu como esquecimento deve ser entendido como o tempo certo em que a vingança de Deus acontece.
- Quando ele não atendeu a oração do seu filho: O clamor de Jesus “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? … Deus meu, clamo de dia, e não me respondes” coloca em uma nova perspectiva a minha oração, seja qual for o meu pedido a Deus. O simples fato de poder orar diretamente a Deus foi privilégio que Cristo me proporcionou quando aceitou encarar o esquecimento de Deus com a atitude certa: “Meu Pai, se possível, passe de mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu queres” (Mt 26.39).
O esquecimento humano pode estar relacionado com a memória (isto é, com a falta dela) ou com diversos outros fatores, mas o esquecimento de Deus deve ser sempre associado a um propósito maior e além do que podemos imaginar.
Daniel Santos